Capítulo 15

O resultado da análise do solo da mina da vila ficou pronto.
O que Sérgio temia se concretizou: a contaminação era séria, e se ele não fechasse a mina imediatamente, muitos garimpeiros iriam morrer.

- IMPOSSÍVEL! – esbravejou.
- Eu refiz o teste três vezes, senhor Sérgio, e deu a mesma coisa.
- Pois refaça cinco, cem vezes!
- Senhor, me desculpe, mas o resultado não irá mudar. O senhor precisa fechar a mina.
- NUNCA!
- Mas senhor..
- NUNCA, ESTÁ ME ENTENDENDO? NUNCA! Vá até lá, invente uma desculpa, leve alguns remédios e roupas caras, eles gostam disso. Logo eles esquecem essa bobagem e tudo voltará ao normal.

Mas Flávio sabia que as coisas não voltariam ao normal.
Não demoraria muito até que outros garimpeiros ficassem doentes e morressem.
Logo a imprensa descobriria o caso e o império deles ruiria.
Seria o fim de EgoVille.
A ordem de Sérgio veio a calhar: Flávio iria até a vila, entregava os remédios e roupas, e trazia Marcela com ele.
Na volta se separaria de Letícia e recomeçaria sua vida ao lado de Marcela.
Sairia de casa apenas com a roupa do corpo, pois deles, não queria nada.
Não seria fácil, mas valeria a pena arriscar.

Os mineradores estavam furiosos.
“Não queremos esse monte de lixo! Pode levar tudo de volta!” – gritou um deles, incitando os demais, que trataram de erguer os braços, concordando com ele.

- Pessoal, por favor, tenham calma! – implorou Flávio, temendo ser linchado.
- Diga ao seu patrão que nós não estamos à venda – disse Clemente, quase erguendo Flávio pelos colarinhos – nunca estivemos! Se aceitamos migalhas até agora é porque acreditamos nas mentiras e falsas promessas. Isso agora acabou.
- Mas isso é apenas uma parte, não pude trazer tudo de uma vez.

Flávio sabia que isso não era verdade.
Ele queria apenas deixar aquelas coisas e resgatar Marcela daquele lugar horrível, daquela vida de abusos que ela sofria.
Depois lavaria suas mãos sobre tudo isso.
Sérgio que colhesse o que plantou.

Quanto mais Clemente esbravejava na sua frente, mais sentia vontade de “sair no braço com ele”, e dá-lhe uma boa surra, para que ele visse como é bom enfrentar alguém do seu tamanho, e não mais cometesse tamanha covardia com sua filha e sua família.
Foi o Padre Bosco que conseguiu acalmar a situação e refugiar Flávio, mais uma vez, em sua casa paroquial.

- Não sei o que o seu patrão pensa, mas isso é absurdo – disse o Padre Bosco.
- Eu sei, padre. Mas infelizmente estou fazendo apenas o que está ao meu alcance. Acredite, se eu tivesse poderes para fazer alguma coisa, seria tudo bem diferente. Mas eu não sou ninguém naquela empresa. Só me dei conta disso há alguns dias. Padre Bosco, tenho muita vergonha de vir aqui fazer o “servicinho sujo” deles. Mas até algumas semanas atrás eu sequer sabia que tudo isso aqui existia, que essas pessoas todas viviam nessas condições.
- Tudo bem, meu filho, eu acredito em você. Mas eu segurei esta situação até onde pude. Agora, além de não conseguir mais contornar esse conflito, não acho justo o que seu chefe está fazendo.
- O senhor está completamente certo, padre. O senhor fez o que pôde, agora eles terão que arcar com as consequências.

- Mas isso é loucura, Flávio, não posso ir com você! – disse Marcela, com espanto nos olhos.
- Marcela, é a única forma de ficarmos juntos. – insistiu Flávio.
- Não posso deixar minha mãe e minha irmã aqui. Não sei o que meu pai seria capaz de fazer!
- Podemos leva-las conosco.
- Minha mãe jamais aceitaria.
- Marcela, eu não irei embora daqui sem te levar junto comigo!

Marcela não percebeu, mas Lúcia estava escondida, ouvindo toda a conversa.
E é claro que aproveitou a oportunidade de ouro que tinha em suas mãos para prejudicar sua irmã, e correu para contar uma história mirabolante para Clemente.

Quando Marcela voltou para casa, Clemente já a esperava em pé, no meio da sala, com o cinto na mão.
Lúcia não escondia sua felicidade, enquanto Dora chorava desesperadamente.

- Já mandei você calar a boca, mulher! – gritou Clemente.

Foi então que Marcela percebeu que desta vez nem sua mãe havia escapado da fúria de Clemente.
Ela temia o pior. Sabia que seu castigo seria terrível.
Olhou rapidamente pela sala, e viu Clara escondida, toda encolhida, debaixo da mesa da sala.
Aparentemente ela havia sido poupada.
“Graças a Deus!”, pensou Marcela.

- Então quer dizer que você está se deitando com o forasteiro, não é sua desgraçada?
- O quê!? Jamais, meu pai, jamais!
- Cale a boca! Você não tem o direito de falar comigo! Eu tenho nojo de você! Não acredito que sustentei você e a vagabunda da sua mãe para vocês duas me traírem pelas costas!
- Trair? Mas ninguém...
- Não me interrompa! Eu vou mostrar pra você como que uma mulher descente deve se comportar, sua imoral!

A vila inteira ouvia os gritos de Marcela. Mas ninguém se atrevia a cruzar o caminho de Clemente.
Todos sabiam do que aquele homem era capaz.
Percebendo o alvoroço, Flávio correu para a rua, perguntando à primeira pessoa que apareceu, o que estava acontecendo.
“Parece que o pau está comendo na casa do Clemente”, explicou um dos garimpeiros. “Coitada daquela família!”, complementou.

Flávio sentiu um frio na espinha, e sabia que o que Marcela estava passando era por sua culpa.
Correu até a casa de Clemente, bateu à porta, mas só ouvia os gritos de Marcela e seu pedido de socorro.
Clemente gritava para que ele fosse embora, mas Flávio insistia. As pessoas tentavam tirar Flávio de lá, mas ele se recusava sair.
E quanto mais ele insistia para que Clemente abrisse a porta, mais Marcela gritava por socorro.
Num ato de desespero, Flávio arromba a porta da casa e voa para cima de Clemente.

- Agora chega! Nunca mais o senhor irá abusar destas crianças!
- Saia daqui, seu capacho do diabo! Elas são minhas, eu mando nelas, e elas vão fazer o que EU mandar. Você NUNCA vai tirá-las de mim, entendeu? Saia já daqui ou eu lhe mato, seu desgraçado!

Sentindo um enorme desespero, Flávio não sabe de onde, mas juntou uma força gigante, e como se seu braço tivesse vontade própria, ele dá um soco na cara de Clemente, que cai desacordado.
Ele nunca havia feito isso na vida!
“Caramba, como dói!”, gritou Flávio, sacudindo a mão.

Flávio correu e abraçou Marcela.
Era a primeira vez que se abraçavam de verdade.
Aquele abraço significava tudo para ambos.
Por alguns segundos o mundo parecia ter parado.
Não havia dor, nem sofrimento. Havia apenas os dois, abraçados ali.

Flávio pôde sentir pela primeira vez o cheiro de Marcela.
Que cheiro gostoso ela tinha!
Cheirava a campo, a flores, a inocência.
Passou a mão em seu cabelo macio, sua pele delicada, embora um pouco judiada do sol.

Marcela sentiu o calor do corpo de Flávio. Sentiu-se segura em seus braços fortes e ao mesmo tempo carinhosos.
Aquilo era muito, muito melhor do que ambos um dia haviam sonhado.
Mas de repente, como num supetão, eles foram trazidos de volta à realidade.
Marcela sabia que precisava sair dali o mais rápido possível, pois assim que seu pai acordasse, com certeza ele a mataria, e mataria sua mãe também.

- Venha comigo. Vou te tirar daqui, te dar uma vida digna.

Marcela olhou para a mãe. Dora olhou em volta. Parecia que ela estava revendo sua vida toda.

- Dona Dora, por favor, vamos! Se a Senhora não for, a Marcela também não irá. E a Senhora sabe o que lhes aguarda quando seu marido recobrar a consciência.

Dora não disse nada. Apenas estendeu a mão, alcançando Marcela.

- Clara! – gritou Marcela, estendendo-lhe a mão.
A menina saiu de seu esconderijo e correu pegar a mão de Marcela.
Mãe e filhas estavam abraçadas, prontas para correr.

- E a sua irmã? – perguntou Flávio.
- Ela fica! – disse Marcela com convicção.

- Nada disso! Eu vou junto! – tentou Lúcia.

Quando Marcela foi argumentar com a irmã, Dora fez um gesto para que a filha se calasse.
Com passos lentos, porém firmes, ela caminhou em direção à Lúcia.
Ficou olhando fixamente e profundamente para seus olhos por alguns segundos.

- Mãe! Mãezinha! Por favor, não me deixe aqui!

Em um ato de muita coragem, relembrando anos e anos de abusos, e tudo o que sua filha mais velha havia aprontado para provocar a ira de Clemente, que sempre recaía nela e Marcela, Dora reuniu forças e deu um tapa na cara de Lúcia.
Ela ficou ali parada, sem ação, com a mão no rosto que ardia onde levou o tapa, assistindo sua mãe e suas irmãs saírem de lá com Flávio.

Foram apenas com a roupa do corpo, para nunca mais voltar.

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